Voltava para casa, dia desses, final da tarde, mais uma jornada corrida de trabalho. Como faço usualmente, no trem, lia atentamente o interminável, mas muito bom – recomendo - (554 páginas) - Abusado, Dono do Morro Santa Marta, de Caco Barcellos. Trajava calça e camisa sociais, como regra o cerimonial no meu ambiente profissional. Enfim. Lá pelas tantas, começou a ladainha: “senhoras e senhores........” Era um menino, 12, 13 anos, no máximo. Miúdo, porém eloqüente. Chegou perto com suas balas de goma. Ajudei com dois reais, embora recusasse a mercadoria. Percebi que minha atitude causou surpresa no moleque. Ele se afastou, mas continuava me olhando. Sagaz e exercendo seu poder de associação, retornou ao meu lado. Respirou fundo, como se tomasse coragem. De certo pensou, "agora é o momento". Talvez aquela dúvida o viesse atormentando há horas. O diálogo foi rápido:- O senhor é da igreja?
- Não.
- Ah, tá. Sabe o que é? Eu queria perguntar uma coisa.
- Pergunta.
- É verdade que o Harry Potter é do diabo?
- Hein? Como é? Não, claro que não. Isso é tudo mentira, conversa fiada, não vai atrás.
- Ah, obrigado tio, tchau.
E lá se foi na próxima estação. Desembarcou, adentrando em outro vagão para seguir com a labuta. Perdi a concentração na leitura. O guri se tornou o meu personagem daquele dia.


1 comment:
hihihihihih muito pom!
ABS! Basileo
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